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A Via Crucis da CND

Há muito que as empresas se deparam com as dificuldades de manutenção da emissão periódica das certidões de regularidade fiscal. Hoje, além daquelas situações previstas em lei, a apresentação de Certidão Negativa de Débito, a chamada CND, é quase mandatória, na maior parte das contratações, mesmo entre entes privados, servindo a mesma como um “Atestado de Bons Antecedentes”.

Se, por um lado, a tecnologia aprimorou os meios de obtenção de informação da situação dos contribuintes, perante o Estado, certo é que ela não foi suficiente à desburocratização da atividade estatal. Assim, se o sistema informatizado da Receita Federal acusa uma diferença qualquer entre valores de tributos que deveriam ter sido pagos pela empresa e os valores efetivamente recolhidos, automaticamente, a CND da empresa é bloqueada, sendo necessária a visita às suas agências, para que o contribuinte conheça o motivo do bloqueio da sua certidão.

Sem a menção do elenco de razões, muitas vezes evitáveis, de inclusão pelo Estado de empresas no “banco dos devedores”, cita-se exemplificativamente o caso das compensações tributárias, autorizadas pela lei, que muitas vezes não são computadas adequadamente pela Receita Federal.

Mas certo é que empresas que possuem histórico de recolhimentos importantes e em dia, ficam desacobertadas, de uma hora para outra, na acusação de falta de pagamento de um mísero Real.

Não bastasse, se o tributo em questão for do tipo que o próprio contribuinte declara periodicamente dever, como é o caso da maioria dos tributos federais (IR, CSLL, PIS e COFINS), e se for apurada diferença entre a declaração da empresa e a guia de recolhimento do tributo, a Receita Federal encaminha imediatamente o caso para a Procuradoria da Fazenda Nacional, que por dever de ofício manda inscrever o débito na Dívida Ativa da União.

Nesta altura, não há mais o que o contribuinte fazer na esfera administrativa, porque o débito está pronto para motivar a propositura de ação de execução fiscal pela Procuradoria da Fazenda.

Em caso de necessidade de contratar o poder público, vender imóveis, tomar empréstimos ou linha de crédito público, dentre outras atividades comuns ao andamento da empresa, a ela, nesta situação, sobra somente se antecipar aos fatos, constituindo advogado e se socorrendo do Judiciário para obter certidão de regularidade fiscal a tempo e a hora de poder desenvolver a sua atividade empresarial. Então, a empresa que já sofre com a carga tributária que assola o País, que tem sua folha de salários onerada pela contratação de pessoal destacado a cuidar da manutenção das suas certidões de regularidade fiscal (Federal, Estadual, Municipal, FGTS), ainda contribui para assoberbar o Judiciário com questões meramente administrativas, que deveriam ser dirimidas nas repartições competentes, mas não o são.

E isso tudo emperrando a atividade empresarial. Não se tem a finalidade aqui de defender sonegadores de impostos. Na verdade, o que se pretende é lançar uma luz sobre a desproporção que assumiu a exigência da apresentação de CND. Se de um lado o Estado busca se precaver do “calote”, reduzindo a atividade dos maus pagadores, em contrapartida, há um verdadeiro engessamento da atividade empresarial saudável.

A tecnologia contribui de forma decisiva na ação do Estado. Certamente há meios de desenvolvimento de um canal de comunicação eficaz, entre o Estado e o contribuinte, via internet, por exemplo, capazes de evitar a visita constante às repartições públicas e suas intermináveis senhas e filas. Por este canal, poderiam ser apontadas ao contribuinte as incongruências acusadas no sistema, com a concessão de tempo razoável para a sua justificação, sem a aposição de uma guilhotina sobre o pescoço da empresa.

Tanto já se fez pelo aparelhamento do Estado com vistas ao acompanhamento da atividade empresarial e decorrente arrecadação. Já está na hora de investir no aprimoramento das máquinas e dos homens que se encontram a serviço desse Estado, para o contribuinte sério e produtivo começar a ser tratado como parceiro e não como inimigo.

Sandra Kauffman Zolnerkevic
Sócia de Del Manto, Kauffman & Menezes – Sociedade de Advogados
Artigo publicado no Jornal Gazeta Mercantil, edição de 12.12.07, página A3

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