Dívida Fiscal e a Serasa

Há dias vem circulando nos noticiários a intenção da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional de editar uma Portaria para regular o registro de dívidas com a União Federal nos bancos de dados da Serasa.

Na verdade, há tempos que os bancos de dados da Serasa vêm sendo abastecidos com informações de ações judiciais, inclusive aquelas relativas à cobrança das dívidas para com a União Federal. A novidade seria o registro na Serasa de débitos inscritos em dívida ativa, mesmo antes da propositura da ação judicial.

A Serasa que se auto-intitula entidade de caráter público, é empresa privada (multinacional), cujo objetivo é a prestação serviços de informações cadastrais e creditícias a clientes com os quais mantém convênio. Não faz juízo de valor sobre os dados arquivados, nem se considera responsável pela qualidade das informações arquivadas em seus bancos de dados.

A União Federal, por sua vez, já dispõe de registro para apontar as dívidas das pessoas jurídicas e físicas perante os órgãos e entidades federais, denominado CADIN – Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal, e que permite à Administração Pública Federal uniformizar os procedimentos relativos à concessão de crédito, garantias, incentivos fiscais e financeiros, e, ainda, a contratação mediante processos licitatórios em geral.

Proliferam, com justa razão, as críticas à pretendida iniciativa da Procuradoria.

A utilização da Serasa constitui um meio coercitivo desautorizado, para a União forçar o pagamento de dívidas fiscais pelos contribuintes (tal e qual a recusa injustificada de emissão de Certidão Negativa de Débito), quando já existe cadastro específico para esse fim, regulado por lei federal.

Afinal, a prática demonstra que pode ser extenso o elenco de razões para a União incluir contribuintes pessoas jurídicas e físicas no tal no “banco de devedores”, citando-se, exemplificativamente, equívocos costumeiros em casos de compensações tributárias, autorizadas pela lei, que muitas vezes não são computadas adequadamente pela Receita Federal, causando indevidas inscrições em Dívida Ativa, com prejuízos para a iniciativa privada.

Considere-se, ainda, que a maioria dos tributos federais (IR, CSLL, PIS e COFINS) é declarada periodicamente, pelo próprio contribuinte (DCTF), e, se apurada diferença entre a declaração do contribuinte e a guia de recolhimento do tributo, a Receita Federal encaminha o caso para a Procuradoria da Fazenda Nacional, que, hoje inscreve o débito na Dívida Ativa da União. Se concretizado o novo projeto da Procuradoria, o débito seria também registrado na Serasa.

O cenário tende a ser sombrio, porque atualmente, o índice de erro nas inscrições em Dívida Ativa pela Procuradoria é altíssimo, tanto que o Judiciário encontra-se assoberbado com ações movidas pelos contribuintes para cancelamento de débitos indevidamente exigidos pela União.

Por outro lado, considerando que as dívidas tributárias têm regime próprio e eficaz de cobrança, o único objetivo a ser alcançado com o novo apontamento parece ser a adoção, pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, de sanção política (não tributária) ao contribuinte, absolutamente rechaçada pelos Tribunais, incluindo-se o Supremo Tribunal Federal.

O constrangimento da empresa de ver as suas atividades limitadas pela “negativação” na Serasa, levará à quitação imediata por ela, de débitos, incluindo-se aqueles indevidos e passíveis de discussão.

Outro aspecto a ser levado em consideração é o tipo de apontamento que constaria do banco de dados da Serasa. Até o presente momento, as informações sobre débitos fiscais inscritos em dívida ativa somente são disponibilizadas pela Procuradoria ao próprio contribuinte ou a seus procuradores, preservando-se o necessário sigilo.

A partir da nova iniciativa da Procuradoria, estas informações, de caráter privado, se tornarão públicas, já que estarão disponíveis para todo o universo de consulentes da Serasa.

Sustenta-se, no entanto, que antes da instituição de novos mecanismos de embaraço ao exercício da iniciativa privada, como a inscrição na Serasa, melhor seria se a energia da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional fosse direcionada para os reais problemas que afetam a relação Fisco – Contribuinte, para desemperrar a atividade empresarial no País, que redundaria na arrecadação de mais tributos, em última instância.

Sandra Kauffman Zolnerkevic
Sócia de Del Manto, Kauffman & Menezes – Sociedade de Advogados
Artigo enviado para Força Tarefa de Direito Tributário da Amcham (American Chamber), em 10.12.07

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